sábado, 28 de fevereiro de 2015 54 comentários

Ser Pai De Santo Na Umbanda

                       



    Hoje venho falar de algo muito especial, ser Pai de Santo.

    Antes vamos observar apenas a palavra "Pai".

    Ser Pai é algo tão sublime como ser Mãe, apesar de muitas pessoas
darem uma importância suprema a palavra "Mãe".

    E entendo esse exaltar, entendo o amor pela palavra Mãe, mas dou a
mesma importância ao Pai. E falo isso por mim mesmo, pois sou pai. Um
pai na doce expressão de ser realmente um pai.
O pai que cuida, educa, se preocupa, ama seu filho acima de tudo. O
pai que se levanta nas madrugadas frias para verificar se seu filho
não passa frio, o pai que vela pelo sono tranquilo de seu protegido em
noites de tempestade, o pai que se desespera pelo pequeno atraso de
seu menino já crescido, o pai que chora com o choro de sua eterna
criança, o pai que ri das piadas sem graça de seu comediante mirim.
Enfim, o pai que ama seu filho como se ele fosse o único ser existente
na face da terra.

    Acredito que todos os pais deveriam ter esse sentimento, essa
preocupação, esse amor.

    E alguns pais, que amam seus filhos, se estendem com essa
nomenclatura de "Pai" para algo um tanto maior, pois levam esse amor
tão imenso para dentro da religião que ama, como por exemplo a nossa
linda e sagrada Umbanda. E a partir daí se tornam nossos Pais de
Santo, que na maioria das vezes são tão importantes para nós como
nossos pais consanguíneos.

    Abaixo gostaria de anexar um texto que recebi de uma amiga, Fernanda Almeida,  para
melhor demonstrar o amor de um Pai de Santo aos filhos de seu
Terreiro. Em um tom de desabafo, esse texto é uma verdadeira
demonstração de amor aos Filhos de Santo, e que muitos desses filhos
que frequentam uma casa de Umbanda, não entendem ou não percebe o
imenso carinho e amor que um Pai de Santo, e gostaria nessa frase
também mencionar as queridas Mães de Santo, pois o amor é igual, tem
por seus amados Filhos de Santo.

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                    Desabafo de um Pai de Santo.

Autor: Cláudio Alessandro Lino.

"Queridos filhos de santo que hoje se reúnem para falar mal de pais e
mães de santo, Gostaria em nome de meus co-irmãos pedir-lhes desculpas
por termos abertos nossas portas para recebê-los sem muitas vezes
conhecê-los profundamente.

    De perdermos nossas noites de sono tentando arrumar uma solução
para os problemas que vocês criaram para suas vidas, de nos privar de
algumas coisas em nossas vidas pessoais porque precisávamos ajudar um
filho que não fez sua parte na casa.

    De ampará-los, de brigarmos com vocês achando que nossos conselhos
iriam lhe encaminhar para o melhor, de suas vidas terem melhorado um
pouquinho, mais para vocês não ser o suficiente, de nos importarmos em
querer o melhor para vocês.

Simplesmente desculpem, continuaremos aqui, muitas vezes magoados com
suas atitudes e falhas, porém com a certeza de que daqui há pouco
passará e faremos tudo novamente pois o nome disso é MISSÃO!!!

Reflitam!"

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    Esse relato em forma de desabafo de nosso amigo acima demonstra
bem que até mesmo alguns filhos de Santo de uma casa não compreendem,
não percebem e não valorizam seus verdadeiros Pais de Santo.

    E o que podemos entender como "verdadeiro Pai de Santo"?

    O Pai de Santo é aquele que vemos como um caminho a seguir, é
aquele que não usa de seu título para induzir seus filhos a errar, é
aquele que mostra que a Umbanda é uma religião não um comércio da fé,
é aquele que protege seu terreiro e seus consulentes contra médiuns
prepotentes, vaidosos, mentirosos e mistificadores, é aquele que
abraça seu Filho de Santo como abraça um filho consanguíneo,
educando-os, encaminhando-os e amando-os.

    Gosto de frisar para deixar muito claro, que nem todas as pessoas
que estão a frente de um Terreiro, que vestidos com o branco de nossa
Umbanda, que paramentado com Guias de contas sejam Pais de Santo,
pois, um Pai de Santo não é feito por roupas ou guias, ele é feito de
um intenso grau de mediunidade, honestidade, caráter, humildade e
amor.

    Não se deixem enganar pelos falsos Pais e Mães de Santo que
transformaram sua missão em poço de vaidade ou em um modo de adquirir
bens econômicos enganando seus semelhantes.


    Por várias vezes as pessoas me perguntam se eu acho agradável ser
um Pai de Santo, e por mesmo número de vezes eu não sei bem o que
responder. Não porque não ache agradável, em alguns casos até poderia
dizer que sim, pois a Umbanda é algo tão sublime em suas
demonstrações de amor e fé, que extremamente agradável fazer parte
desses grupos, e mais ainda de ser uns dos que está a frente dessa
disseminação de caridade e fé.

    Dentro da Umbanda não há um tradicionalismo, como em outras
religiões, pois não tendo regras escritas dando poderes de líder ao
Pai de Santo, estando ele a frente de uma casa de Umbanda, será ele
que vai dirigir o terreiro, sendo assim sua palavra tem uma grande
força nas decisões tomadas dentro daquela casa.

    O fato é que, em muitas casas, ele não é nomeado nem eleito, ele
tem fiéis seguidores que aceitam e acreditam no que é pregado pelo
mentor da coroa dele.

    O Pai ou Mãe de Santo são os chefes da comunidade de fiéis que
buscam ajuda, desenvolvimento mediúnico, tratamento espiritual e
abrigo sobre o teto de seu Terreiro.

    O Orixá do Pai de Santo será sempre o chefe espiritual da casa.
Ele marca a linha de trabalho do terreiro e a entidade dessa linha que
incorpora nele sempre será o chefe espiritual do terreiro que ditará
todas as normas e regras para o seu funcionamento.


    Finalizando, o Pai de Santo é um Médium extremamente preparado,
mas é um médium como todos os Médiuns frequentadores de uma casa de
Umbanda. Foi desenvolvido mediunicamente e espiritualmente para ser "O
Pai de Santo", o que vai mostrar caminhos, o que vai buscar ajudar ao
filho que necessita, o que vai trabalhar ´para o desenvolvimento dos
Filhos de Santo. E isso além de missão é uma obrigação.

    Então não é necessário que idolatre um Pai de Santo, mesmo que ele
exija isso.

    Pai de Santo não é para ser idolatrado, apenas basta respeitá-lo
como líder da religião, que é tão linda e sagrada, a nossa Umbanda.

Saravá todos os Pais, Mães e Filhos de Santo de nossa Umbanda!



Carlos de Ogum.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015 80 comentários

MALANDRO NAVALHA, O SALVADOR DOS MORROS.

   Malandro Navalha, o Salvador dos Morros.

    No morro eu nasci,
no morro me criei,
Do morro não fugi,
e no morro morrerei.

    Me chamo Navalha o Malandro,
em Ogum entreguei minha fé,
ando pelo morro gingando,
assim como faz meu mestre, Pilintra, o Zé.

    Uso minha navalha para curar,
doentes que do morro não podem descer,
a Oxalá peço para me ajudar,
a essas doenças do morro esquecido vencer.

    Não temo a justa nem a rádio patrulha,
meus irmãos do morro continuarei a ajudar,
esse caminho do bem que tanto me orgulha,
com Zé Pilintra junto estarei sempre a caminhar.

    Sou Malandro Navalha protegido de Ogum,
tenha sempre cuidado quando me chamar,
no Terreiro de Umbanda chego em nome de Olorum,
mas se me pedir o mal posso te derrubar.

    É sempre encantadora as giras dos Malandros e Malandras,
normalmente com a presença iluminada e carismática do grande Mestre Zé
Pilintra.

    Mas hoje vamos falar da história de um grande mestre também na
linha da malandragem.

    Uma história que vai nos mostrar o quanto é linda essa linha, como
é que nosso personagem foi escolhido para atuar como Entidade de Luz
nos Terreiros de Umbanda, como são caridosos para com aquele que
necessita, como era usado a lábia da malandragem para ir em busca de
ajuda aos menos favorecidos, enfim, uma história para tirar a falsa
impressão de que um Malandro seja uma Entidade que faz o mal.

    Vamos falar de nosso amigo de luz Malandro Navalha, companheiro de
Seu Zé Pilintra nas andanças pelos morros, pelo bairro da Lapa ou por
toda a cidade do Rio de Janeiro, buscando condições e materiais para
assim poder auxiliar aos moradores dos morros lá pelo início do
século XX.

    Nascido e criado nas ruas e vielas da Lapa, bairro
tradicionalmente conhecido pela boemia, Zé da Lapa, como era conhecido
na região, tinha um incômodo pessoal, não entendia o porque da
diferença entre as pessoas, ou pela posição social, ou pela cor da
pele.

    Ao ver a descriminação dos moradores dos morros, ao ver o desprezo
que muitos tinham pelos negros, ao ver os males físicos, que por
muitas vezes seriam tão simples de serem curados dizimando milhares de
pessoas sem uma chance de cura, pelo simples fato de serem de raças
diferentes, deixava nosso personagem Zé da Lapa muito entristecido.

    Ele sonhava com um mundo melhor, mundo esse em que todos se
respeitassem, se ajudassem, se entendessem.

    Mas a realidade era totalmente ao inverso disso. Os moradores dos
morros, normalmente negros que sofreram nas amarras de seus senhores,
que hoje estando em uma falsa liberdade, sofriam e morriam, não mas
como escravos de senhores, mas sim escravos da sociedade branca,
preconceituosa, racista e podre.

    O sentimento de caridade e justiça de Zé da Lapa começou a virar
algo concreto quando ele conheceu uma pessoa que tinha o mesmo
sentimento dele. José Amadeu da Silva, um pernambucano arretado, que
chegou ao Rio de Janeiro após muitas aventuras de sua vinda do
Nordeste do Brasil.

    Ao se conhecerem, numa dessas noites de boemia no bairro da Lapa,
e entenderem que os dois tinham o mesmo pensamento, José Amadeu e Zé
da Lapa se uniram para levar ajuda aos menos favorecidos.

    Zé da Lapa era astuto, carismático, inteligente e extremamente
habilidoso ao lidar com os homens de farda. Chegava como quem não
queria nada, e de conversa em conversa já virava o grande amigo
brincalhão no meio dos policiais que tomavam conta das entradas dos
morros, para não deixarem entrar medicamentos, comida e água aos
moradores da parte mais elevada da cidade. Fazendo isso, distraía os
homens da lei enquanto seu amigo José Amadeu e todos os outros
"malandros" e "malandras" agiam sorrateiramente, subindo e descendo os
morros levando suprimentos a quem necessitava.

    Zé da Lapa também aprendeu a cuidar de ferimentos, e por muitas
das vezes surpreendia a todos com a pericia do manejar sua navalha na
limpeza de grandes ferimentos, abrindo a carne e retirando todo o
edema contido na parte do corpo machucado.

    Ele fazia isso com uma simplicidade extrema, se utilizando da
própria cachaça para a limpeza dos ferimentos e da sua navalha,
evitando assim qualquer tipo de infecção.

    As lendas dizem que nenhuma pessoa tratada pela navalha de Zé da
Lapa sentiu a mínima dor, tanto nos cortes quanto nas limpezas, e ele
fazia isso rotineiramente, sempre conversando e sorrindo para a
pessoa em tratamento de suas escaras.

    Após fazer esse trabalho de caridade por muitos anos, ele passou a
ser conhecido como o Malandro da Navalha Sagrada, e por esse motivo,
ao virar uma Entidade de Luz nos trabalhos da Umbanda, passou a ser
chamado de Malandro Navalha.

    Malandro Navalha teve seu desencarne ainda com pouca idade, ele
mesmo não confirma a quantidade exata, mas cremos que foi entre os 30
a 35 anos de idade terrena.

    E isso aconteceu numa noite de inverno em plena Lapa, local que
ele amou e viveu toda a vida.

    Como sempre estava Zé da Lapa em busca de fazer a caridade, nas
mãos levava alguns medicamentos e a tradicional garrafa de marafo,
também levava em sua cintura sua inseparável navalha cor de prata. Ao
chegar na subida que o levaria ao morro onde dezenas de pessoas o
aguardavam para cuidados com os ferimentos, Seu Malandro Navalha
observa um grande tumulto de pessoas, notando que dentre elas estaria
algumas dezenas de homens da lei. Ao se aproximar mais um pouco, ele
se depara com uma imensa covardia que o deixara em êxtase. Um dos seus
companheiros de jornada em prol da caridade, que era conhecido como Zé
Preto, um Malandro sorrateiro,, muito astuto, mas muito ligado no
sentimento profundo de amor que tinha por sua companheira e ´por seus
três filhos, que para ele era toda a riqueza que tinha em sua vida.

    Zé Preto estaria em luta corporal com alguns homens da lei, em seu
lado sua companheira demonstrando um extremo desespero, implorando
clemência a sua família, e mais atrás seus filhos prisioneiros, cada
um deles nas mãos de um policial.

    O motivo de todo o tumulto fora que os filhos de Zé Preto foram a
área baixa da cidade em busca de água fresca para ser levada a um
ex escravo muito velho e adoentado, que era tomado por um mal que o
deixava em condição febril de grandes proporções. As crianças ao verem
a situação decidiram ir em busca de água, e se depararam com o
grupamento, que logo entenderam qual era a intenção dos meninos e os
agrediram além de despejar por terra toda a água que levavam.

    A mãe das crianças ao ver toda a cena foi em defesa de seus
filhos, que foi espancada cruelmente e jogada ao chão, e mesmo ao chão
não deixou de ser espancada.

     Ao ouvir os gritos de dor de sua amada e o choro desesperado de
seus filhos, Zé Preto corre em defesa de sua família, e entra em luta
corporal com alguns homens de farda.

    Foi nesse momento que Zé da Lapa, o Malandro Navalha chega, e
nesse mesmo momento o filho caçula de Zé Preto se solta das mãos do
seu prendedor correndo de encontro a sua mãe que ainda se contorce de
dor ao chão. Nessa fuga o soldado arma seu mosquete para alvejar a
criança, e nesse momento Zé da Lapa se joga sobre o menino o
protegendo do chumbo ardente da arma do homem da lei, mas a munição
penetra o corpo de Zé da Lapa chegando até seu coração, fazendo assim
uma dor física descomunal, mas uma paz em seu espírito por ter
conseguido livrar da morte uma pequena criança inocente que só
desejava matar a sede de um velho negro febril.

    Nos dias de hoje Senhor Malandro Navalha trabalha fazendo a
caridade nos terreiros de Umbanda. Demonstrando a paz, o amor,
mostrando caminhos de luz a serem seguidos, ensinando a seus
consulentes que Umbanda não é para fazer o mal aos semelhantes, não é
para destruir lares, não é para fazer amarrações. Ela está presente em
nossas vidas para nos religar a Zambi, nosso Pai Maior. E aqueles que
forem ao encontro de nosso Malandro Navalha para pedir o contrário,
será tentado ser demonstrado o erro que estão fazendo, e se mesmo
assim não aprenderem com o ensinamento do amor, poderá ter uma lição
constituída na dor.

    Assim falou Senhor Malandro Navalha.

Saravá todos os Malandros!

Saravá Senhor José Pilintra!

Saravá nosso amigo fiel de todas as horas, Senhor Malandro Navalha!

Carlos de Ogum.






 
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