Cosmezinho chegou na Umbanda,
ele veio pra trabalhar,
traz a alegria pra nossa banda,
traz a luz a nosso Gongá.
De sorriso aberto ele vem,
pulando aqui pulando pra lá,
com a benção de Oxum ele tem,
a luz de nosso Pai Oxalá.
Cosmezinho de Oxum é uma Entidade de Luz da nossa Umbanda, que vem
na linha das Ibeijadas (crianças), para alegrar as Giras, trazendo
bençãos, ajudando na caminhada rumo a nossa evolução.
Ele tem a predominância da Orixá Oxum, e por esse motivo tem uma
afeição pela cor azul.
Está sempre pulando e se mexendo, cantando e dançando, brincando e
sorrindo como uma boa criança muito levada. Mas quando tem que fazer os
trabalhinhos espirituais, o faz com imenso carinho e muita dedicação.
A história encarnada desse menino de Oxum teve seu acontecimento
pelo final do século XIX, na região Sul do Brasil.
Ele nasceu em uma família de colonos imigrantes italianos, que
vieram para o Brasil em busca de trabalho a muitas décadas antes do
nascimento do menino, que teria o nome de Fabrizio.
Fabrizio já estava com seus 5 anos quando um dia andando pelas
terras de um grande fazendeiro que tinha enormes vinheiras e grandiosa
quantidade de gado, observou o coronel expulsando de suas terras uma
família de negros, que ali passava em busca de trabalho e de comida.
Esse dito coronel vinheiro, tinha ainda na mente a essência da
escravatura que tinha sido abolida a pouco tempo. E no seu sangue e na
sua mente corria as maldades que tanto fez durante toda sua vida
contra os negros escravizados.
Ao observar isso o menino Fabrizio, foi até o coronel e na
simplicidade da infância perguntou o que aquelas pessoas tinham feito
para serem tratadas de um modo tão hostil.
O fazendeiro olha o menino com os olhos enraivecidos, e num tom
áspero lhe pergunta: "VoCê não viu que são apenas negros?"
E com isso o fazendeiro sai esbravejando, deixando o pequeno
Fabrizio sem nada entender o porque daquele acontecimento.
O menino corre para a choupana onde residia com seus familiares,
chega a seu pai e conta a história tentando buscar uma resposta pelo
acontecimento. Mas o pai apenas disse: "Se afaste dessas pessoas, o
coronel não gosta delas, então é melhor ficarmos distantes."
Os dias foram passando, mas o acontecimento com a família de
negros não deixava o menino em paz. Quando menos se esperava, lá
estava ele pensando no fato.
Certa manhã, Fabrizio andando pela fazenda com um grande
recipiente de leite que fora buscar no curral, a mando de seu pai, vê
um menino negro ao longe, tentando se esconder por entre as árvores.
Ele corre ao encontro do menino e tenta um diálogo, mas em vão, pois o
menino se assusta e corre por entre as matas.
Fabrizio não se faz de rogado e corre também, tanto que alcança o
menino. Chegando até ele, após uns minutos de conversa o menino diz
que estava tentando encontrar um pouco de comida, pois ele estava
escondido em uma caverna junto com sua família e outros vários negros,
e nessa caverna se encontrava muitas pessoas doentes e famintas,
dentre essas pessoas estaria o pai dele que, por estar muito fraco
não conseguiu nada para ele, seus irmãos e sua mãe comerem.
Fabrizio pede que o menino negro o leve até a caverna, mas antes
ele iria buscar o recipiente de leite que ele tinha deixado ao sair
correndo.
E assim fizeram. Ao chegarem na caverna, muitos negros ficaram
assustados ao verem ali um menino branco, mas logo se acalmaram quando
o menino ofereceu-lhes o leite para beberem.
Fabrizio sentou-se em uma pedra, olhou com seu olhar de criança
aquelas pessoas famintas, doentes e machucadas. Seus olhos
lacrimejaram, e ele entendeu enfim, o que era o fato acontecido entre
o coronel fazendeiro e os negros, que hoje tinham uma falsa
liberdade, tudo aquilo não passava de crueldade dos brancos.
Ele se levantou, saiu da caverna, andou por alguns minutos dentro
da mata, até chegar nas margens de um rio, no qual se encontrava uma
linda cachoeira de águas límpidas. Sentou-se bem próximo a ela,
colocou suas mãos no rosto e chorou copiosamente, fazendo com que suas
lágrimas de criança se misturassem com as gotas de água vindo da
cachoeira.
Sem entender muito bem o porque daquela dor, sem saber o porque
daquele sofrimento todo. Ele apenas chorava, até que em um momento se
lembrou de sua avó, uma velha de sotaque forte italiano, que lhe
dizia que quando as coisas estavam sem resposta, a melhor resposta é
falar com Deus através de uma oração vinda do coração. E foi isso que
o menino fez. Se pôs de joelhos de frente a cachoeira e conversou com
Deus.
Em meio de suas orações, ele percebe uma linda imagem de mulher
que saía como de dentro da linda cachoeira. Essa imagem foi tomando
uma forma monumental, um lindo manto azul, uma mulher de sorriso largo
e de olhos meigos. A mulher chegou até o menino e disse para que ele
não tivesse medo, pois ela era um Anjo de Deus, e veio ali por causa
de sua oração.
O menino, encantado ficou, e sem o menor receio começou a falar, a
falar e a falar sem parar. Tropeçava nas próprias palavras, saltitava,
pulava, se mexia, fazia sinais com as mãos, enfim, ficou muito
eufórico com a resposta de suas orações.
A linda mulher se apresentou com o nome de Oxum, ela dizia ser a
deusa da cachoeira, e estava ali para ajudá-lo a ajudar aquelas
pessoas que tanto sofriam.
Ele com os olhos brilhando de felicidade por um instante teve
receio, pois sabia que era apenas uma criança e não sabia como fazer
para ajudar seus novos amigos.
Ele cerra os olhos grandes e azuis e pergunta a Oxum o que fazer.
Como poderia fazer algo para ajudar sendo ele tão pequenino.
Mas Oxum com seu jeito maternal lhe disse:
"Sua fé me trouxe até aqui, sua fé vai lhe mostrar o que fazer, como
ajudar. Você é um pequeno menino, mas tem dentro de si um grande
coração amoroso e uma coragem de gigante. Não se aflija que estarei
sempre com você, mesmo na hora que você achar que não estarei. Você
em pouco tempo vai se encontrar comigo, em outro lugar, em outro
plano. Cumpra sua missão aqui, resta só ela. E após isso sua missão
será de uma forma diferente, em outro lugar e sempre elevado a Zambi,
que você conhece como Deus.
Só não esqueça de fazer tudo com amor, sem medo, mesmo que você
não entenda os acontecimentos momentâneos, pois assim como você passou
a entender o ódio de um homem branco sobre os negros, você vai
entender tudo que poderá acontecer a partir de agora, até seu encontro
novamente comigo."
O pequeno Fabrizio naquele momento se sentiu mais forte, mais
feliz, e cheio de planos para ajudar seus amigos negros. Saiu
saltitando como se em uma festa se encontrasse, balançava seus cabelos
loiros encaracolados como se inventasse um novo modo de dançar. Seu
sorriso estava grandioso, sua mente não parava um só instante, sabia
que ele poderia ajudar. Ele confiava nele, confiava na sua nova
protetora, a linda Oxum, e confiava em Deus acima de tudo.
Era apenas uma pequena criança, que agora tinha uma grande
responsabilidade adulta, salvar a vida de pessoas inocentes.
Correndo por entre a mata ele chegou até a caverna, foi direto ao
negrinho de olhos esbugalhados que com ele estivera antes. O negrinho
ao vê-lo sorriu, um sorriso largo de dentes muito claros e olhos
brilhantes como as estrelas.
Fabrizio lhe da um abraço e diz que agora ele tem como ajudar a
todos ali. Os dois sorriam e saem pulando e correndo atrás das
borboletas e pássaros numa brincadeira infantil.
O plano de Fabrizio começa a ser executado, todos os dias ele ao
buscar o leite, pegava não só para a sua família, mas também pegava,
de uma forma escondida, para os negros que estavam na caverna. E não
só o leite o menino levava, passou a levar milho, café, ovos, peixes,
carnes e tudo mais o que podia levar sem que ninguém percebesse.
Se demonstrou interessado em ajudar na casa grande onde residia o
coronel e a família, e de lá levava algumas roupas, e agasalhos,
também levava alguns xaropes que uma negra velha que ainda residia na
casa fazia para curar o peito cansado dos mais fracos.
E assim fez por algum tempo, dia após dia, era aquela rotina de
ir em busca de comida, remédios e tudo mais que pudesse conseguir para
auxiliar seus amigos.
Um dos jagunços do coronel percebeu a ação do menino, e logo
passou a vigiá-lo. Quando teve certeza dos atos do pequeno Fabrizio,
ele, o jagunço mesquinho, falou tudo que descobriu ao coronel.
O coronel não teve dúvidas, sabia que o menino estava ajudando os
negros que ele tanto odiava. E com isso mandou então o jagunço com
mais outros homens começarem uma caçada implacável em busca do local
onde se encontravam os refugiados, aqueles que na visão do coronel não
mereciam viver sobre a mesma terra que ele habitava.
As matas eram fechadas e perigosas, a caverna onde se encontravam
os negros era distante e bem escondida, fazendo assim com que os
jagunços não a encontrassem. E isso deixou o coronel ainda mais
irritado e tomado pelo ódio, pois mesmo que os jagunços tentassem
seguir o pequeno menino, ele, mesmo sem saber que estava sendo
seguido, tomava caminhos diferentes, corria por entre os grandiosos
troncos como se estivesse brincando, com uma grande agilidade se
colocava em cima das árvores, subia e descia como os esquilos que ele
por muitas vezes acompanhava. E mesmo correndo em zigue-zague, por um
caminho ou por outro, de uma forma milagrosa ele chegava a caverna.
Coisa que os jagunços não conseguiam, pois sempre perdiam o pequeno
Fabrizio por entre as sombras da grande floresta.
O coronel, após o relato de seus capangas, fica irritadíssimo, e
manda expulsarem a familia de Fabrizio de suas terras, que são
obrigados a sair sem poder levar nada.
Fabrizio ao entender o que se passou, foi até seu pai e contou
toda a história. Disse a ele sobre a caverna e os negros que lá
viviam, e fez questão de levar o pai e a família até a caverna.
Chegando lá, vendo a situação que muitos negros se encontravam, soube
do bem que o filho fez, vendo que sem aquela ajuda do menino muitos
dos negros teriam desencarnado, o pai de Fabrizio o abraçou e chorou,
se orgulhando de seu filho.
A família de Fabrizio permaneceu na caverna, buscavam abrigo
enquanto o pai tentava buscar outra fazenda para trabalhar. E Fabrizio
não descansou, continuou indo a fazenda as escondidas para pegar
alimentos juntamente com outras crianças negras.
Certo dia em uma dessas idas e vindas da caverna para a fazenda,
Fabrizio para e observa uma jovem a beira do rio trazendo pela mão uma
menina que aparentava a sua idade ou pouco menos. Ele se senta próximo
de uma árvore, onde também estaria seu amigo, o negrinho de olhos
esbugalhados. Os dois atônitos com olhos parados, observavam a menina
brincando com a água junto a sua cuidadora. Fabrizio sabia que a
menina era filha do coronel, já tinha a visto algumas vezes nos
arredores da fazenda. Seu espanto foi ver ela ali tão distante de sua
casa, longe dos olhos do coronel ou de sua esposa.
A cuidadora da menina era uma jovem ainda, que parecia estar a
procura de alguém ou alguma coisa pelos arredores. Ficava olhando para
todos os lados, sem prestar muita atenção ao que a menina fazia.
Em dado momento aparece um dos jagunços do coronel, que ao longe
observa os meninos nos galhos das árvores. De imediato ele retorna do
caminho de onde viera para ao encontro com o coronel ao modo de
chamar-lhe atenção sobre a presença dos meninos em suas terras.
O coronel tomado por um ódio descomunal cavalga em direção ao rio
onde se encontrava os meninos, sem saber que sua filha por lá também
se encontrava.
Nesse mesmo momento a cuidadora displicente segui para um lado do
rio onde se encontrava alguns lírios brancos que chamaram sua atenção
deixando a menina só.
Fabrizio e seu amiguinho descem dos galhos das árvores indo ao
encontro da menina, que aos vê-los sorri, com um sorriso amigável e
meigo. Se aproximam e conversam, brincam, fazendo assim uma nova
amizade. Uma amizade infantil, verdadeira e pura.
Mas toda essa alegria duraria pouco. Aos galopes o coronel chega
em seu cavalo, desce do animal já com o açoite na mão deferindo contra
o pequeno menino negro, que cai. O coronel continua a bater na criança
com uma violência descomunal. A menina grita, chora. Fabrizio corre
tentando fazer o coronel parar, ele empurra e derruba o menino, e
volta a atacar o menino negro, que já tem o corpo sangrando e inerte.
A menina desesperada corre em direção contrária de seu pai, chega
a beira do rio, escorrega e cai na água, e é tomada pela força da
natureza que a leva arrastada.
O coronel se desespera ao ver a menina ser sugada pelos
redemoinhos de águas bravas do rio, da mesma forma o menino Fabrizio,
que corre pelo leito tentando salvá-la.
Em dado momento o menino em um gesto de desespero mas ao mesmo
tempo de nervosismo se atira nas águas do rio, e com uma força
descomunal consegue alcançar a mão da pequena menina a puxando para
si.
Como em um milagre a traz para uma parte mais branda da margem,
onde o coronel estendia as mãos para salvar sua filha. Fabrizio a
empurra com toda sua força, o coronel a alcança, retira a menina
puxando-a para fora das águas revoltosas.
O menino Fabrizio pede ajuda esticando suas pequenas mãos para o
coronel e para o jagunço que está a seu lado. O fazendeiro olha com
olhar de desdém para o menino, se virando com sua filha nos braços. O
jagunço entende o recado do coronel, e com os pés empurra o menino
para o fundo do rio, que novamente foi pego pelo poderoso redemoinho.
O menino desaparece por entre as águas de Oxum, enquanto a menina
recupera a consciência, e ainda atordoada não entende muito bem o
acontecido.
Ela firma os olhos, vê seu pai, começa a vir as cenas do fato em
sua mente, ela chama pelo garoto, no mesmo instante que vê o corpo,
já sem vida, do menino negro ser atirado nas águas do rio pelo
jagunço do coronel fazendeiro.
Ela chora copiosamente, enquanto o pequeno corpo do menino afunda
no rio. Nesse instante aparece sobre as águas uma luz forte e
ofuscante, dessa luz se nota a imagem de uma linda mulher, a mesma
imagem que Fabrizio viu na cachoeira. No centro dessa luz, ao lado da
mulher, a imagem do pequeno Fabrizio, sorridente, pulando e
balançando seus cachos dourados como sempre. Ele estende as mãos como
se pegasse algo, e do centro do rio, a imagem do pequeno menino negro
de olhos grandes e arredondados aparece indo ao encontro de seu
amigo, e sendo abraçado carinhosamente pela linda Oxum, como
demonstração de proteção eterna.
A menina ao ver isso saiu correndo de encontro ao trio, se jogando
nas águas revoltosas do rio. E novamente fora levada pelos grandes
redemoinhos assassinos que ali reinavam.
A menina nunca mais fora vista, seu corpo tomado pelas forças das
águas desapareceu como por encanto. O coronel em desespero profundo,
após muitas buscas, desistiu da própria vida, e diante do rio se matou
para tentar acabar com seu sofrimento.
Sete dias após a morte do coronel, a sua esposa tem uma visão da
sua filha, que de mãos dadas com Fabrizio e Juca, o menino negro, lhe
diz para abrir as porteiras da fazenda, trazendo não só os negros que
estavam na caverna, mas também a família de Fabrizio para ajudá-la no
plantio das vinheiras e nos cuidados com o gado, para que assim não
só ela desfrutasse das dádivas da natureza, mas todos aqueles que
necessitavam de matar a fome. E assim foi feito, a fazenda foi
transformada em um grande local para auxiliar a quem necessitava, com
auxilio de colonos e negros trabalhando junto em prol da caridade,
sobre o comando da esposa do falecido coronel.
As crianças felizes ficaram por saberem e entenderem que fizeram o
bem a muitos que necessitavam.
A menina filha do coronel, ainda reencarna em busca de maiores
evoluções para chegar a seu objetivo que é ter a benção de Deus e um
dia ser uma Entidade de Luz trabalhadora para a espiritualidade.
Juca, que hoje é conhecido como "Juquinha das Almas", está no
caminho da evolução final para a espiritualidade. Se encontra em
terreiros de Umbanda, ainda não em incorporação em médiuns, mas com
grande vontade de trabalhar para a caridade.
Hoje Fabrizio é conhecido como Cosmezinho de Oxum nos terreiros de
Umbanda. Ele com o mesmo jeitinho de criança levada, faz a caridade,
espalha alegria, ensina o amor, demonstra a paz, dançando,
pulando e sorrindo, sempre de um modo infantil e carinhoso. Porém
muito travesso e brincalhão.
Salve as Crianças de Umbanda!
Salve Cosmezinho de Oxum!
Salve toda a Ibeijada!
Carlos de Ogum